segunda-feira, 3 de maio de 2010

LCP, art. 42

Emmy Pereira Otani

Dados do acórdão
Classe: Apelação Criminal
Processo: 2008.027307-8
Relator: Sérgio Paladino
Data: 14/08/2008
Apelação Criminal n. 2008.027307-8, de Joaçaba

Relator: Des. Sérgio Paladino

APELAÇÃO CRIMINAL. CONTRAVENÇÃO PENAL. PERTURBAÇÃO DO SOSSEGO ALHEIO. PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. RECURSO DESPROVIDO.

Se o conjunto probatório aponta com segurança a materialidade e a autoria da contravenção penal narrada na denúncia, inviabiliza-se a absolvição.

"Perturba o sossego público e merece condenação como incurso no art. 42, I e III, da lei especial, quem de madrugada promove algazarra, gritaria, brada palavrões ou liga instrumento sonoro em tom excessivamente alto (TACRIM-SP ¿ AC ¿ Rel. Galvão Coelho ¿ JUTACRIM 57/313)" (Franco, Alberto Silva; Ninno, Jefferson; Silva Júnior, José; Betanho, Luiz Carlos; Moraes, Maurício Zanoide de; Podval, Roberto; Stoco, Rui; Feltrin, Sebastião Oscar, e Ninno, Wilson, Leis penais especiais e sua interpretação jurisprudencial, volume 1, 7. ed. rev., atual. e ampl., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 220).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 2008.027307-8, da comarca de Joaçaba (Vara Criminal), em que é apelante Jean Carlos do Carmo e apelada a Justiça, por seu Promotor:

ACORDAM, em Segunda Câmara Criminal, à unanimidade, negar provimento ao recurso. Custas legais.

RELATÓRIO

Na comarca de Joaçaba, o representante do Ministério Público ofereceu denúncia contra Jean Carlos do Carmo, dando-o como incurso nas sanções dos arts. 147, caput, e 129, § 9º, ambos do Código Penal, e do art. 42, do Decreto-lei n. 3.688/41, todos combinados com o art. 69, do aludido estatuto, em razão dos fatos assim descritos, ipsis verbis:

Infere-se do auto de prisão em flagrante incluso que o denunciado Jean Carlos do Carmo conviveu maritalmente com a ofendida Daniela Kossian por aproximadamente cinco anos, cujo relacionamento foi marcado pelo comportamento violento por parte do varão, que agredia diariamente a companheira, imprimido-lhesevícias físicas e morais.

Quando embriagado, o denunciado tornava-se ainda mais violento, agredindo a vítima por meio de socos, pontapés, tapas, garrafadas, mordidas, puxões de cabelo e até mesmo facadas, deixando em seu corpo as marcas da violência, além de ameaçá-la de morte constantemente.

Diante de tamanha agressividade do companheiro e temendo pela segurança sua e da filha V., de apenas um ano de idade, a vítima era obrigada a deixar o lar, refugiando-se na casa de familiares.

Neste contexto, no dia 22 de março de 2007, por volta das 7h, ao chegar em casa embriagado, o denunciado, por questões de somenos importância, passou a agredir fisicamente a companheira que se encontrava no oitavo mês de gestação, desferindo-lhe tapas na face e batendo sua cabeça contra a parede, causando-lhe as lesões corporais descritas no laudo de fl. 10.

Não satisfeito, o agressor ainda ameaçava matá-la juntamente com a filha V., a fim de se eximir do pagamento da pensão alimentícia.

Diante disso, e temendo que as ameaças do companheiro viessem a se concretizar, a vítima saiu de casa, indo se abrigar na residência dos pais, localizada na rua Antônio Torteli, bairro Vila Nova, em Água Doce.

Inconformado com sua atitude e pretendendo agredi-la ainda mais, o agente se dirigiu até o local, onde, na presença de todos, reiterou as ameaças contra Daniela e V., passando a provocar e ofender também os seus familiares, proferindo inúmeros impropérios.

As provocações e ameaças perduraram até tarde da noite, perturbando o sossego de toda a família e também dos vizinhos.

Na manhã seguinte, por volta da 6h, o denunciado já bastante embriagado e portando dois litros de cachaça, retornou ao local, onde voltou a ofender e ameaçar a vítima e seus familiares, reafirmando que iria matar a filha V. para se eximir do pagamento da pensão alimentícia.

Farto das provocações e com receio de que as ameaças proferidas pelo denunciado viessem a se concretizar, o pai de Daniela acionou a Polícia Militar que esteve no local, autuando o agente em flagrante delito.

Nesta ocasião, o denunciado ainda investiu contra os policiais, que o imobilizaram e conduziram até a delegacia (fls. II/V).

Homologado o auto de prisão em flagrante e recebida a denúncia (fl. 27), citado (fls. 33/34) e interrogado (fls. 31/32), o réu apresentou a defesa prévia, em que requereu a produção de prova oral, apresentando rol idêntico ao do dominus litis (fls. 36/37).

Ato contínuo, o magistrado concedeu-lhe o benefício da liberdade provisória (fls. 38/39), tendo decretado, contudo, pouco tempo depois, a sua prisão preventiva (fl. 47).

Inquiridas a vítima (fl. 56) e uma das testemunhas (fl. 66), houve a desistência quanto à remanescente, pleiteando o réu, com sucesso, a revogação da custódia cautelar (fl. 65).

Ofertadas as derradeiras alegações, por memoriais e na ordem legal (fls. 68/78), o Dr. Juiz de Direito proferiu a sentença, por meio da qual julgou procedente, em parte, a denúncia, absolvendo o réu dos delitos definidos nos arts. 147, caput, e 129, § 9º, ambos do estatuto repressivo, com fundamento no art. 386, inciso IV, do Código de Processo Penal. Condenou-o, porém, à pena de 15 (quinze) dias de prisão simples, em regimeaberto, por infração ao art. 42, inciso I, da Lei das Contravenções Penais. Presentes os requisitos legais, substituiu a privativa de liberdade por uma restritiva de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade (fls. 79/85).

Inconformado, o apenado apelou, objetivando a absolvição ao argumento de que não há no processo provas suficientes para alicerçar o veredicto condenatório (fls. 92/94).

Com as contra-razões (fls. 97/100), os autos ascenderam a esta Corte, manifestando-se a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer do Dr. Demétrio Constantino Serratine, pelo conhecimento e desprovimento do recurso (fls. 105/107).

Convertido o julgamento em diligência a fim de que, na origem, o escrivão certificasse a data em que o advogado do apelante foi intimado do teor da sentença, os autos retornaram a este Tribunal.

VOTO

Não procede a insurreição, em virtude da farta prova existente nos autos, quer da materialidade, quer da autoria da contravenção, consubstanciadas no auto de prisão em flagrante (fls. 02/06), no boletim de ocorrência (fl. 08), nas informações prestadas por Arlindo Kossian (fl. 04 e verso) e nos depoimentos dos policiais Roberto Carlos Chaves (fls. 02, verso e 66) e Gilson José Barp (fl. 03), elementos de persuasão que analisados em conjunto, autorizam a condenação.

Revelam os autos que na noite dos fatos, o apelante, embriagado, dirigiu-se até a residência dos pais de sua esposa, Daniela, onde a mesma se encontrava, passando a madrugada do lado de fora, perturbando o sossego dos vizinhos, com gritaria e algazarra, cessando apenas com a chegada da Polícia.

Apesar do apenado negar a autoria, as declarações de seu sogro, Arlindo Kossian, e dos policiais que efetuaram a prisão não deixam dúvidas de que ele perturbou o sossego dos familiares, bem assim dos vizinhos, não tendo produzido uma prova sequer apta a infirmar a contida nos autos, em sentido contrário, limitando-se a negar que tenha estado no local quando ocorreu o evento.

Ademais, o policial Roberto Carlos Chaves relatou em seu depoimento que conversou com vizinhos ao chegar no local, os quais confirmaram que o apelante naquela noite perturbou o repouso dos moradores. Gize-se que o policial disse que ele já era conhecido do meio policial por se haver envolvido em vários eventos semelhantes (fl. 66).

Portanto, percebe-se que as suas alegações contrariam os elementos de convicção existentes nos autos, impendendo que se dê crédito aos relatos dos milicianos que o prenderam, não lhe socorrendo a retratação, em juízo, da vítima, que confirmou, detalhadamente, as agressões, na fase policial e ao magistrado (fl. 26), quando indagada se pretendia representar o companheiro. Ademais, não fosse, isso, a retratação da vítima alcança apenas os delitos de ameaça e lesões corporais, não repercutindo na conduta contravencional.

No concernente à validade dos depoimentos dos policiais, proclamou a Suprema Corte, verbis:

O valor do depoimento testemunhal de servidores policiais ¿ especialmente quando prestado em juízo, sob a garantia do contraditório ¿ reveste-se de inquestionável eficácia probatória, não se podendo desqualificá-lo pelo só fato de emanar de agentes estatais incumbidos, por dever de ofício, da repressão penal.

O depoimento testemunhal do agente policial somente não terá valor, quando se evidenciar que esse servidor do Estado, por revelar interesse particular na investigação penal, age facciosamente ou quando se demonstrar ¿ tal como ocorre com as demais testemunhas ¿ que as suas declarações não encontram suporte nem se harmonizam com outros elementos probatórios idôneos (HC 73.518, rel. Min. Celso de Mello, DJU de 18.10.96, p. 39.846).

Portanto, configurada a perturbação do sossego, consumou-se a contravenção penal capitulada no art. 42, inciso I, do Decreto-lei n. 3.688/41.

Em hipótese assemelhada, assentou a jurisprudência:

"Perturba o sossego público e merece condenação como incurso no art. 42, I e III, da lei especial, quem de madrugada promove algazarra, gritaria, brada palavrões ou liga instrumento sonoro em tom excessivamente alto (TACRIM-SP ¿ AC ¿ Rel. Galvão Coelho ¿ JUTACRIM 57/313)" (Franco, Alberto Silva; Ninno, Jefferson; Silva Júnior, José; Betanho, Luiz Carlos; Moraes, Maurício Zanoide de; Podval, Roberto; Stoco, Rui; Feltrin, Sebastião Oscar, e Ninno, Wilson, Leis penais especiais e sua interpretação jurisprudencial, volume 1, 7. ed. rev., atual. e ampl., São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, 2002, p. 220).

DECISÃO

Ante o exposto, negou-se provimento ao recurso.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, com votos vencedores, os Exmos. Srs. Des. Salete Silva Sommariva e Tulio Pinheiro, emitindo parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Dr. Demétrio Constantino Serratine.

Florianópolis, 29 de julho de 2008.

Sérgio Paladino

PRESIDENTE E Relator

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